Primeiro na Classe, Último no Jogo?

                                                                           Pr. Davi Merkh

Entrei na sala e logo em seguida ouvi a gargalhada.  Olhei no quadro negro, e entendi porque: mais uma vez alguém havia me "desenhado".  Cabeça e óculos enormes, orelhões e aquele olhar esquisito do "crânio".  Me pegaram de novo.  Meu problema?  Era o primeiro da classe.

Claro que ser primeiro na classe tem suas vantagens.  A gente sai da terceira série antes de ter que fazer a barba.  Ainda somos menores de idade na oitava série, e por isso não precisamos gastar dia 15 de novembro numa fila interminável de votação.  E nunca somos tentados a gastar um dinheirão comprando gabaritos de exames para podermos passar de ano. 

Não é nada fácil ser o cérebro da turma, especialmente para o jovem cristão que já se sente margenalizado por ser "diferente".  Algumas das lutas que pode enfrentar incluem:

*Ser considerado o "xodozinho" da professora

*Não fazer parte das panelas mais "quentes" da escola; ser excluído de festas, jogos, etc.

*Sofrer pressão para colaborar na cola

*Ter que fazer a maior parte de trabalhos em grupo

*Sofrer a "síndrome de perfeição": uma vez que estabelecemos um padrão alto, ninguém fica contente com qualquer coisa menos de "10". 

*Ser ridicularizado pelos outros, como se nossa inteligência fosse tão desejável como contrair dengue nas suas férias

*Ser acusado de "elevar o padrão" da turma, assim fazendo os outros parecerem burros

Como pode o aluno cristão lidar com estes "males" de primeiro da classe?  Dois jovens na Palavra de Deus, José e Daniel, nos fornecem exemplos de garra e fibra em meio a zombaria, provação e até perseguição por serem "primeiros de suas classes".

Pelo que entendemos em Gênesis, José era um rapaz super-inteligente, lindo, responsável e fiel (Gn. 37, 39:6).  Lemos sobre Daniel que ele era de "sangue nobre", inteligente (talvez brilhante) e que era contado entre os melhores jovens em todo o Israel (Dn. 1:2-4).  Ambos destes jovens sofreram pelas suas habilidades especiais.  Mas também receberam os "parabéns" de Deus, e recompensas que  contrabalançaram as inconveniências que sofreram por serem os "primeiros da classe".  A vida destes dois jovens nos ensina alguns princípios muito práticos, para podermos "agüentar a barra" como alunos de destaque:

1.  Seja fiel, custe o que custar.  Estou convencido de que a maioria daqueles que são "primeiro da classe" não são mais inteligentes que o resto da turma.  Muitas vezes são simplesmente mais responsáveis.  Entregam trabalhos na data prevista.  Não deixam que o cachorro coma suas tarefas de casa.  Estudam para provas.  Fidelidade muitas vezes explica a distinção entre mediocridade e excelência.

Infelizmente, o jovem fiel é muitas vezes tentado a abaixar o padrão.  A pressão de colegas para ser igual a eles pode ser quase insuportável.  Daniel e José sofreram pressão enorme, mas sabiam que o que Deus queria em seus filhos era fidelidade (1 Co. 4:1).  Ambos eram jovens de destaque em todos os sentidos, por serem fiéis.

2.  Seja íntegro.  Outra tentação do jovem inteligente é de sacrificar sua integridade no altar da popularidade.  A pressão para colar pode ser tremenda, especialmente quando a resistência resulta em gozação, margenalização, ou até mesmo ameaças.  Assim, José e Daniel enfrentaram forte "persuasão" para abaixarem seu padrão de integridade.  Os irmãos de José não gostaram nem um pouco do padrão alto que ele havia estabelecido.  Fazia com que eles parecessem maus.  Daniel também foi tentado a quebrar a lei de seu Deus, comendo comidas proibidas para ganhar o favor do rei.  Mas recusou, preferindo o aplauso do céu do que a aceitação dos homens. 

3.  Tenha confiança na bênção de Deus.  Para agüentar as hostilidades de colegas (e até irmãos) ciumentos, o jovem precisa confiar nas promessas de Deus de um futuro brilhante.  A gozação é difícil, mas é temporária e não chega a ser nada em comparação com os galardões que Deus oferece no futuro próximo e distante (cf. Rm. 8:17).  José sofreu repetidas vezes pela sua insistência em manter um padrão alto, mas no fim não somente foi elevado a uma posição de destaque, como também salvou a vida de toda a sua família (Gn. 50:20).  Daniel foi perseguido por colegas invejosos, mas Deus libertou-o da boca dos leões (Dn. 6).  O jovem cristão precisa lembrar que a pressão ajuda a lapidar caráter.  Provérbios nos adverte "Se te mostras fraco no dia da angústia, a tua força é pequena" (24:10).  Vale a pena esperar a bênção de Deus, sendo firmes nos "dias da angústia".

4.  Não vingue-se.  Precisamos fugir da tentação de nos vingar, retribuir ou simplesmente rir na cara de um colega que não passa de ano (ou de prova).  José tinha toda oportunidade de dar troco para seus irmãos depois de tudo que havia sofrido às mãos deles, mas ao invés disso abençoou-os.  Daniel nunca mostrou um espírito vingativo contra seus inimigos, mas esperava a hora de Deus, que "acertou as contas".  Provérbios nos lembra, "Não digas, 'Vingar-me-ei do mal'; espera pelo SENHOR, e ele te livrará" (20:22).

5.  Não seja orgulhoso.  É muito difícil para quem nunca tirou nota menos de "9.0" entender alguém que nunca tirou nota acima de "8,0".  Impaciência, ridicularização ou um ar de superioridade e  arrogância nunca convem ao jovem cristão.  O primeiro da classe precisa sempre lembrar as palavras de Paulo em 1 Co. 4:7: "Pois quem é que te faz sobressair? e que tens tu que não tenhas recebido? e, se o recebeste, por que te vanglorias, como se o não tiveras recebido?"  Cabe ao jovem cristão "primeiro da classe" ajudar os seus colegas, e compreender suas dificuldades.  Deve ser compassivo para com aqueles que não tiveram os mesmos privilégios como ele, sempre lembrando de que tudo que ele tem ele recebeu como dom de Deus para ser usado no serviço de outros. 

Nunca gostei nem um pouco dos desenhos que ocasionalmente enfrentava no quadro-negro da minha classe.  Mas descobri, com o passar de tempo, que no fundo os outros alunos me respeitavam.  Tive oportunidades de ajudá-los em seus estudos e também pude testemunhar para eles explicando porque não podia colar nas provas. Mais tarde, quando recebi os resultados do vestibular, sabia que valia a pena nunca ter relaxado diante da pressão.  Valeu a pena continuar "firme e inabalável" (1 Co. 15:58).  E havia outra vantagem.  Quando me formei do colégio, não precisava convidar netos para minha formatura.

Último no Jogo ?